Novo Plano Nacional de Recuperação da Vegetação Nativa visa aumentar escala na proteção da Biodiversidade
Com apoio técnico da TNC, texto atualizado reafirma o compromisso do Brasil de restaurar 12 milhões de hectares de vegetação nativa até 2030.
O Brasil ainda tem chance (e tempo) para restaurar as áreas degradas da sua vegetação nativa? São grandes as expectativas em torno do novo Plano Nacional de Recuperação da Vegetação Nativa (Planaveg 2025-2028), lançado no último dia 28/10, abrindo a segunda semana da COP16.
O documento é um dos componentes na estratégia brasileira para alcançar a segunda das 23 metas acordadas no Quadro Global de Biodiversidade Kunming-Montreal, que determina a restauração de pelo menos 30% das áreas degradadas no mundo, seja cumprida no Brasil, além de apoiar ações para alcançar também as metas de clima do país. Um marco importante no desenvolvimento do pensamento estratégico no qual as instituições se reconhecem e alinham melhor as suas ações em direção a um objetivo comum.
Dentre os complexos desafios que a nova versão do Planaveg busca superar, só a floresta amazônica tem um passivo ambiental1 de 14 milhões de hectares, que bate quase três vezes o tamanho do Estado do Rio de Janeiro, sendo 72% em terras privadas. Graças ao ritmo acelerado que o desmatamento avança na Amazônia, o bioma se aproxima do ponto de não retorno. Antes que isso aconteça, o texto atualizado segue reafirmando a meta de clima definida no Acordo de Paris, para restaurar 12 milhões de hectares de vegetação nativa até 2030.
Foram seis anos – desde a sua primeira edição (2017) – até que fosse feita uma nova revisão no Planaveg, considerando o contexto e desafios atuais. Desta vez, envolvendo diversas redes e coletivos biomáticos2 de todo o Brasil, a fim de absorver perspectivas mais plurais e descentralizadas. Entre eles o time da The Nature Conservancy (TNC) Brasil apoiou na revisão técnica do documento, com a União pela Restauração (U4R)3, propondo os chamados “arranjos de implementação”, que listam os atores envolvidos em cada tipo de projeto, quais instrumentos podem ser utilizados e a interação entre eles. Divididos em três grandes grupos com as respectivas expectativas de como devem contribuir para a meta: áreas de preservação permanente e de reserva legal, com 9 milhões de hectares; áreas rurais de baixa produtividade, com 1 milhão de hectares; e áreas públicas, com 2 milhões de hectares.
Na prática, “o nosso papel está bastante relacionado em entender e mapear quais são os territórios prioritários para restauração florestal. Por exemplo, quais ações desenvolver para cada região, considerando o perfil socioeconômico da comunidade e seus anseios; quais iniciativas, processos de implementação e investimentos necessários para atender as especificidades de cada bioma”, explica Rubens Benini, líder da Estratégia de Restauração Florestal da TNC Brasil e representante da sociedade civil na Comissão Nacional para Recuperação da Vegetação Nativa (Conaveg).
Para garantir que haja clareza e seriedade na implementação do novo plano, “uma infinidade de variáveis foram consideradas para garantir o engajamento e inclusão de todos os envolvidos na cadeia de restauração – durante o desenvolvimento do Planaveg, comunidades tradicionais, agricultores familiares, povos indígenas e quilombolas foram reconhecidos como agentes protagonista da sociobioeconomia”, destaca Benini.
Isso significa que haverá um trabalho para que os interessados em auxiliar na implementação dos projetos em seu entorno possam contribuir com a coleta de sementes, a manutenção de agroflorestas e viveiros, ou mesmo na venda de produtos fruto da bioeconomia.
O documento também traz insumos de mecanismos inovadores de financiamento, como a criação de um possível fundo garantidor, o fomento ao capital concessional, adequação de linhas de créditos, fortalecimento da integridade de créditos de carbono e novas emissões de dívida verde soberana. Tudo isso, consolidado em quatro estratégias principais: inteligência espacial para monitoramento, fortalecimento da cadeia produtiva de recuperação, pesquisa e inovação para sustentação dos esforços e financiamento de longo prazo.
A colaboração entre os diversos atores4, resultou em três pilares essenciais: Governança, Mecanismos Financeiros e Monitoramento.
Governança e arranjos de implementação: diretrizes para implementar o plano em territórios específicos, como bacias hidrográficas e municípios, no qual aponta modelos de gestão e governança considerando a participação de distintos setores, incluindo os coletivos de restauração, como o Pacto pela Restauração da Mata Atlântica, entre outros;
Mecanismos financeiros: com o objetivo de garantir investimentos e viabilizar a restauração em larga escala, bem como otimizar o fluxo de investimento em territórios prioritários;
Monitoramento e inteligência territorial: traz soluções inovadoras para expandir e otimizar o monitoramento de territórios, por exemplo. Com o apoio de tecnologias de sensoriamento remoto e articulações com plataformas já existentes, o plano propõe a criação de uma plataforma nacional de monitoramento.
O que esperar do Planaveg daqui para frente. Com uma governança articulada em diferentes escalas, o plano vem buscando atuar nas áreas de preservação permanente, propriedades rurais de baixa produtividade e áreas públicas, incluindo unidades de conservação e terras indígenas. “O documento propõe gerar benefícios socioeconômicos, como novos empregos, acesso a mercados sustentáveis e redução dos riscos climáticos, consolidando o Brasil como líder em conservação ambiental”, afirma Rodrigo Spuri, diretor de Conservação da TNC Brasil.
A verdade é que por trás de todas as metas quantitativas e estratégias para trazer escala a restauração vegetal, o objetivo do plano é gerar uma mudança sistêmica, impactando positivamente a segurança hídrica, mitigação e adaptação aos extremos climáticos, conservação da biodiversidade e no desenvolvimento socioeconômico.
“O desafio agora é colocar em prática tudo que está no papel, mas isso só será possível com a união do setor privado, público, sociedade civil e da academia, para que possamos não apenas construir, mas sobretudo implementar modelos sólidos de governança que aterrissam o Planaveg no chão”, conclui Rubens Benini.
1Passivo ambiental se refere à obrigação legal de recuperar áreas desmatadas ou degradadas, principalmente em propriedades rurais. Essa obrigação surge quando a vegetação nativa é suprimida em desacordo com a legislação ambiental, como o Código Florestal (Lei nº 12.651/2012).
2 Coletivos biomáticos são redes colaborativas focadas na restauração ecológica e conservação de biomas específicos no Brasil. Essas redes, como o Pacto pela Restauração da Mata Atlântica, por exemplo, reúnem organizações da sociedade civil, governos locais, instituições de pesquisa e comunidades locais. Cada coletivo atua em seu bioma com estratégias e metas específicas de restauração, promovendo transparência e engajamento multissetorial. Essas iniciativas colaborativas ajudam a monitorar o avanço da restauração e permitem capilaridade para esforços locais, ampliando a preservação ambiental em áreas como o Amazonas, Cerrado e Mata Atlântica.
3 A União pela Restauração (U4R), composta por TNC, Conservação Internacional (CI-Brasil), WRI Brasil e WWF-Brasil, ao lado do Instituto Internacional para Sustentabilidade (IIS) e da Coalizão Brasil Clima, Florestas e Agricultura, desempenharam um papel fundamental neste processo, participando efetivamente no desenvolvimento de políticas públicas para orientar ações de restauração no país e contribuindo para que o Brasil alcance sua Contribuição Nacionalmente Determinada (NDC, em inglês).
4 O novo plano envolveu oito ministérios, governos subnacionais, redes e coletivos biomáticos*, movimentos sociais** e setor privado. Além de um processo de consulta da Comissão Nacional de Recuperação da Vegetação Nativa (Conaveg), liderado pelo Departamento de Florestas da Secretaria de Biodiversidade, Florestas e Direitos Animais do Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima (MMA).