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Restauração de ecossistemas é a chave do combate às mudanças climáticas

Preservar sistemas naturais é o caminho para garantir o equilíbrio e a sustentabilidade do planeta.

Por José Guilherme Fronza, Rubens Benini, Fernando Cesário, Milena Rosenfield e Mario Barroso, da TNC Brasil

Produtores de Água Waterfall in Nazare municipality, part of the Piracicaba-Capivari-Jundia watershed that provides water to 9 million people in the Sao Paulo Metropolitan Area, Brazil. The Conservancy works to set up Water Producer Programs in Brazil's Atlantic Forest, which pay farmers and ranchers for protection and restoration of riparian areas on their lands. Trees planted through this effort bring the Conservancy closer to its goal of planting one billion trees in the Atlantic Forest. © Adriano Gambarini

A chuva intensa que devastou o estado do Rio Grande do Sul nos últimos dois meses escancarou a urgência pela restauração de ecossistemas naturais. Mas argumentos para isso não faltam há muito tempo: só nos últimos cinco anos, o Brasil perdeu mais de 8 milhões de hectares de vegetação nativa, o equivalente a duas vezes o tamanho do estado do Rio de Janeiro – segundo dados do último Relatório Anual do Desmatamento do MapBiomas. Mais da metade de toda a área desmatada em 2023 fica na região do Cerrado..

Suprimir florestas tropicais pode alterar drasticamente o regime de chuvas, aumentando a temperatura em escala local e global. A alta no desmatamento dos últimos meses está por trás de fenômenos como a intensificação da atual temporada de estiagem no Pantanal, por exemplo. Dados do Serviço Geológico do Brasil alertam para a possibilidade de uma seca severa na região nos próximos meses.

Infelizmente, restaurar um sistema não é tão simples quanto degradá-lo. Cada bioma possui sua própria biodiversidade, com uma variedade de plantas, animais e microrganismos que se adaptaram às condições específicas do local. Restaurar não é só recuperar o que foi perdido, mas também adotar medidas efetivas para reduzir e reverter as alterações que ameaçam a integridade e a resiliência dos ecossistemas naturais.

A restauração de ambientes parte do princípio que devemos recompor, em primeiro lugar, o solo e as plantas, já que esses componentes garantem a base da cadeia alimentar. A partir disso, se espera que o efeito dominó aconteça, já que as espécies incorporadas ao sistema geram condições para a chegada de outras espécies, sejam de animais ou plantas, aumentando a biodiversidade.

Do ponto de vista local, ter ecossistemas restaurados e funcionais garante o fornecimento de vários serviços ambientais. Entre eles está o controle da erosão, que evita o assoreamento de rios e baixadas e o surgimento de voçorocas – grandes rachaduras na superfície –, vitais para redução de enchentes e deslizamentos. Em escala regional, o restabelecimento da vegetação natural ajuda a amenizar a temperatura local, melhorando o microclima e a infiltração de água no solo, o que contribui para maior perenidade de águas nos rios e maior controle de inundações.

A atividade de restauração também melhora a polinização, processo importante para a manutenção de culturas agrícolas, na produção de alimentos e controle de pragas. Por fim, em escala global, o crescimento das árvores em plantios de restauração acelera a remoção de gás carbônico da atmosfera e o acúmulo de biomassa, ajudando no controle das mudanças climáticas.

O objetivo do processo de restauração ambiental é recriar ambientes ecologicamente saudáveis e funcionais. Para isso acontecer, é preciso manter três características: estrutura, funcionamento e diversidade de espécies. Isso significa que, durante o processo de restauração, é preciso restabelecer uma estrutura diversificada, com árvores de diferentes alturas e a presença de arbustos e plantas herbáceas, por exemplo. Já o funcionamento se refere aos processos ecológicos que ocorrem dentro da floresta, como a ciclagem de nutrientes, polinização e regeneração natural da vegetação. Eles permitem a manutenção do sistema ao longo do tempo, sem a necessidade de intervenções humanas adicionais.

Embora a restauração remeta à árvores, o processo de restauração pode ser aplicado a qualquer tipo de sistemas naturais, sejam eles terrestres ou aquáticos. Cada sistema vai exigir diferentes métodos em função das características ambientais e da estrutura da vegetação local. As técnicas mais comuns para recomposição de vegetação florestal são o plantio direto de mudas e sementes de espécies nativas. Para ecossistemas aquáticos, muitas vezes é necessário controlar processos erosivos e afastar fatores de degradação, como a descarga de poluentes e a proliferação de espécies invasoras.

Entre os exemplos mecanismos importantes nesta agenda estão a Política e o Plano Nacional de Restauração da Vegetação Nativa (Planaveg), que têm como diretrizes o fomento à cadeia de insumos e serviços ligados à recuperação, assim como o fomento à pesquisa e desenvolvimento para inovação de técnicas à recuperação da vegetação nativa do país. É tarefa do Comitê Nacional para Recuperação da Vegetação Nativa (Conaveg), do Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima (MMA), responsável por propor planos e diretrizes, articular e integrar ações para prevenção e controle do desmatamento ilegal e recuperação da vegetação nativa.

A agenda ambiental não deve ser vista apenas como ideológica ou partidária. Pelo contrário: é preciso que diferentes esferas atuem em conjunto, com foco em soluções coletivas e de longo prazo. Ao nos preocuparmos com a origem sustentável dos produtos que consumimos ou participarmos de iniciativas de restauração em nossa comunidade, doando tempo ou recursos, ou dialogarmos sobre a importância da conservação ambiental, damos passos em direção a um futuro mais sustentável.

O Plano Nacional de Restauração da Vegetação Nativa, publicado originalmente em 2017, está disponível aqui.

Publicado originalmente em Galileu
14 de junho de 2024
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