Restauração de ecossistemas é a chave do combate às mudanças climáticas
Restaurar sistemas naturais é o caminho para garantir o equilíbrio e a sustentabilidade do planeta.
Por José Guilherme Fronza, Rubens Benini, Fernando Cesário, Milena Rosenfield e Mario Barroso, da TNC Brasil
A chuva intensa que devastou o estado do Rio Grande do Sul nos últimos dois meses escancarou a urgência pela restauração de ecossistemas naturais. Mas argumentos para isso não faltam há muito tempo: só nos últimos cinco anos, o Brasil perdeu mais de 8 milhões de hectares de vegetação nativa, o equivalente a duas vezes o tamanho do estado do Rio de Janeiro – segundo dados do último Relatório Anual do Desmatamento do MapBiomas. Mais da metade de toda a área desmatada em 2023 fica na região do Cerrado..
Suprimir florestas tropicais pode alterar drasticamente o regime de chuvas, aumentando a temperatura em escala local e global. A alta no desmatamento dos últimos meses está por trás de fenômenos como a intensificação da atual temporada de estiagem no Pantanal, por exemplo. Dados do Serviço Geológico do Brasil alertam para a possibilidade de uma seca severa na região nos próximos meses.
Infelizmente, restaurar um sistema não é tão simples quanto degradá-lo. Cada bioma possui sua própria biodiversidade, com uma variedade de plantas, animais e microrganismos que se adaptaram às condições específicas do local. Restaurar não é só recuperar o que foi perdido, mas também adotar medidas efetivas para reduzir e reverter as alterações que ameaçam a integridade e a resiliência dos ecossistemas naturais.
A restauração de ambientes parte do princípio que devemos recompor, em primeiro lugar, o solo e as plantas, já que esses componentes garantem a base da cadeia alimentar. A partir disso, se espera que o efeito dominó aconteça, já que as espécies incorporadas ao sistema geram condições para a chegada de outras espécies, sejam de animais ou plantas, aumentando a biodiversidade.
Do ponto de vista local, ter ecossistemas restaurados e funcionais garante o fornecimento de vários serviços ambientais. Entre eles está o controle da erosão, que evita o assoreamento de rios e baixadas e o surgimento de voçorocas – grandes rachaduras na superfície –, vitais para redução de enchentes e deslizamentos. Em escala regional, o restabelecimento da vegetação natural ajuda a amenizar a temperatura local, melhorando o microclima e a infiltração de água no solo, o que contribui para maior perenidade de águas nos rios e maior controle de inundações.
A atividade de restauração também melhora a polinização, processo importante para a manutenção de culturas agrícolas, na produção de alimentos e controle de pragas. Por fim, em escala global, o crescimento das árvores em plantios de restauração acelera a remoção de gás carbônico da atmosfera e o acúmulo de biomassa, ajudando no controle das mudanças climáticas.
O objetivo do processo de restauração ambiental é recriar ambientes ecologicamente saudáveis e funcionais. Para isso acontecer, é preciso manter três características: estrutura, funcionamento e diversidade de espécies. Isso significa que, durante o processo de restauração, é preciso restabelecer uma estrutura diversificada, com árvores de diferentes alturas e a presença de arbustos e plantas herbáceas, por exemplo. Já o funcionamento se refere aos processos ecológicos que ocorrem dentro da floresta, como a ciclagem de nutrientes, polinização e regeneração natural da vegetação. Eles permitem a manutenção do sistema ao longo do tempo, sem a necessidade de intervenções humanas adicionais.
Embora a restauração remeta à árvores, o processo de restauração pode ser aplicado a qualquer tipo de sistemas naturais, sejam eles terrestres ou aquáticos. Cada sistema vai exigir diferentes métodos em função das características ambientais e da estrutura da vegetação local. As técnicas mais comuns para recomposição de vegetação florestal são o plantio direto de mudas e sementes de espécies nativas. Para ecossistemas aquáticos, muitas vezes é necessário controlar processos erosivos e afastar fatores de degradação, como a descarga de poluentes e a proliferação de espécies invasoras.
Entre os exemplos mecanismos importantes nesta agenda estão a Política e o Plano Nacional de Restauração da Vegetação Nativa (Planaveg), que têm como diretrizes o fomento à cadeia de insumos e serviços ligados à recuperação, assim como o fomento à pesquisa e desenvolvimento para inovação de técnicas à recuperação da vegetação nativa do país. É tarefa do Comitê Nacional para Recuperação da Vegetação Nativa (Conaveg), do Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima (MMA), responsável por propor planos e diretrizes, articular e integrar ações para prevenção e controle do desmatamento ilegal e recuperação da vegetação nativa.
A agenda ambiental não deve ser vista apenas como ideológica ou partidária. Pelo contrário: é preciso que diferentes esferas atuem em conjunto, com foco em soluções coletivas e de longo prazo. Ao nos preocuparmos com a origem sustentável dos produtos que consumimos ou participarmos de iniciativas de restauração em nossa comunidade, doando tempo ou recursos, ou dialogarmos sobre a importância da conservação ambiental, damos passos em direção a um futuro mais sustentável.
O Plano Nacional de Restauração da Vegetação Nativa, publicado originalmente em 2017, está disponível aqui.
Publicado originalmente em Galileu
14 de junho de 2024
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