A bacia do Tapajós é uma das mais ameaçadas na Amazônia brasileira. Com seu sistema de rios de águas cristalinas, essa bacia tem quase 500 mil km² e nela vivem aproximadamente 2 milhões de pessoas, pelo menos 800 espécies de aves, 250 de mamíferos e 500 espécies de peixes.
Esta é uma área de incríveis belezas naturais preservadas, mas também que comporta grandes impactos e conflitos ambientais. Um só local onde é possível mostrar o melhor e o pior da realidade da conservação da natureza na Amazônia. Vemos uma contínua expansão do desmatamento, como resultado de disputas crescentes pela terra e pelos recursos naturais. A tensão social e a degradação do ambiente na região incluem avanço desordenado da produção de grãos e pecuária, além da exploração ilegal de madeira e minérios em meio à floresta. Nessa região, com áreas para conservação aquática e terrestre essenciais, é evidente a necessidade e a urgência de se propiciar o equilíbrio entre conservação, desenvolvimento e bem-estar social.
O projeto Águas do Tapajós nasceu da consciência da The Nature Conservancy (TNC) das demandas para apoiar conservação junto com comunidades na região. Em colaboração com a Universidade Federal do Oeste do Pará (UFOPA) e o Movimento de Pescadores e de Pescadoras do Baixo Amazonas (MOPEBAM), o projeto tem por objetivo contribuir para o desenvolvimento local, aumentando o conhecimento sobre o uso sustentável dos recursos aquáticos e a conservação da biodiversidade de água doce na região, apoiando as comunidades ribeirinhas em sua organização, governança e gestão comunitária, para ampliação da sua participação e voz junto a outros atores da região e no planejamento do território. As comunidades ribeirinhas que praticam a pesca artesanal e que dependem dos recursos da bacia para sua sobrevivência e atividade produtiva são os principais parceiros e beneficiários deste projeto.
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Acima de tudo, a TNC atua nas comunidades ribeirinhas com representantes do movimento de pescadores para promover o fortalecimento institucional das Colônias de Pesca, ampliando suas capacidades técnicas para defesa de seus direitos e agregação de valor à pesca. Apoia, também, o desenvolvimento de pesquisas realizadas pela UFOPA, avaliando recursos pesqueiros e aquáticos no rio Tapajós.
Se olharmos para os dados de desmatamento e florestas nativas na Amazônia, as áreas geridas por comunidades tradicionais e Povos Indígenas são as mais protegidas, porém sempre tendo que lidar com a pressão da derrubada de florestas em seus entornos.
O projeto foi pensado para atender as questões levantadas em um estudo detalhado feito pela TNC sobre desenvolvimento, conservação do meio ambiente e bem-estar social na bacia, o Atlas Tapajós 3D, realizado em 2018. O documento faz uma avaliação territorial dos potenciais impactos e riscos dos diferentes empreendimentos e infraestruturas planejados para a região. Apoiando pesquisas desenvolvidas pela UFOPA, o projeto Águas do Tapajós incentiva a auto-organização e governança das comunidades e procura fornecer um maior nível de informação a essas mesmas comunidades, para que elas consigam transformar para melhor a sua realidade e os aspectos que necessitam de ser melhorados e transformados,
Outra pesquisa apoiada está identificando quais as espécies de peixes e quelônios que estão mais ameaçadas, para criar um plano de ação para a conservação dessas espécies, que são importantes tanto para a manutenção da biodiversidade como para a subsistência das comunidades ribeirinhas.
O apoio à governança e fortalecimento institucional das lideranças comunitárias é uma das prioridades do projeto. O objetivo é ampliar a participação das comunidades em tomadas de decisão na região, assim como na elaboração dos acordos de pesca, instrumentos de governança muito importantes para guiar o uso dos recursos pesqueiros, reconhecidos por meio de Decreto Estadual (Decreto 1686/2021 estabelecido pelo Governo do Pará). Nesse trabalho atentamos sempre para garantir a inclusão de gênero nos debates, já que uma das questões observadas na análise da região foi a dificuldade de acesso das mulheres pescadoras ao Seguro Defeso, recurso destinado aos profissionais de pesca durante os períodos em que a atividade é proibida ou limitada para garantir a reprodução dos peixes.
Tive o prazer de visitar algumas das vilas de pesca artesanal que fazem parte do projeto antes da pandemia e fico feliz de ter a oportunidade de conhecer a diferença que um trabalho como esse faz para as comunidades. Dos seus representantes vamos recebendo feedback positivos, nos incentivando para estabelecermos mais projetos que possam garantir um melhor futuro para as comunidades ribeirinhas.
As ações do Águas do Tapajós são parte de um esforço global da TNC, que envolve África, Brasil, Colômbia e Equador, para fortalecer a conservação de base comunitária dos ecossistemas aquáticos, cujo objetivo é valorizar o conhecimento tradicional para fortalecer a proteção da natureza e da biodiversidade.
Nossos trabalhos nessa frente foram destaque na programação de um dos painéis da World Water Week, a maior conferência de conservação de água do mundo, que há mais de 30 anos vem reunindo vários atores mundiais na discussão dos desafios em torno da questão da água e da sua conservação. Neste painel, que contou também com a presença de representantes das organizações Lewis & Clark Law School, Earth Innovation Institute e IFPRI, foi abordada a importância dos direitos à água e aos seus recursos, como a pesca, como forma de alcançar uma sociedade mais justa, capacitando os povos indígenas e as comunidades locais a administrar suas terras e águas. Na sessão foram apresentadas pesquisas e estudos de casos demonstrando que, quando as comunidades locais estão envolvidas, os projetos de conservação e desenvolvimento têm uma maior probabilidade de alcançar resultados duradouros de sucesso para as pessoas e a natureza.
As evidências e a nossa experiência no campo mostram que a chave do sucesso está nas sólidas parcerias com as comunidades ribeirinhas. Em conjunto com elas, também guardiãs dos recursos aquáticos e pesqueiros, será possível assegurar, com empenho e paixão, a conservação do meio ambiente que garante sua subsistência. É necessário, portanto, que os governos e o investimento privado apostem mais nestas ações junto às comunidades, e que canalizem o seu investimento e as ações de filantropia também em programas que têm as comunidades locais e indígenas como atores prioritários.