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COP 27: avanços e retrocessos de justiça climática

Por Andréia Coutinho Louback - Especialista em justiça climática

Justiça climática e conservação
JUSTIÇA CLIMÁTICA COP 27 © Fernanda Macedo / TNC Brasil

Uma Conferência das Partes da UNFCCC (COP 27) na África. Para o Brasil, que possui o maior grupo demográfico composto pela população negra, estar presente - por meio de corpos e vozes - na cidade de Sharm El Sheikh já era muito significativo. Finalmente, o conceito prático de representatividade caminhou ao lado das pautas de justiça climática, apesar de todos os contratempos de se adentrar em um espaço como a  27ª cúpula do clima.  Esta foi a quarta COP realizada em solo africano versus às catorze vezes em que foi sediada na Europa. Diante disso, resta-nos a interrogativa: o que essas escolhas político-institucionais realmente revelam sobre um espaço de governança internacional?

UMA BREVE CONTEXTUALIZAÇÃO

Por muito tempo, o Norte Global sequestrou o tema da justiça climática. Exemplo disso são duas pesquisas de comunicação que apresentam dados comparativos interessantes. Embora o conceito tenha nascido em 1999, foi apenas entre os anos de 2019 e 2021 que o ápice das citações do termo - em inglês - ganhou visibilidade na mídia global. Porém, há de se reconhecer que essa conscientização se dá, sobretudo, devido aos summits e fóruns da ONU. O primeiro pico foi em 2015, quando a justiça climática finalmente entrou no preâmbulo do Acordo de Paris. Isso ainda não havia acontecido em tratados e documentos internacionais. Foi um marco significativo.

O mesmo aconteceu com as buscas por pesquisas acadêmicas centradas em justiça climática. Papers, capítulos de livro e outros documentos foram alvos de contínuas buscas digitais, mas a maioria dessas produções era em inglês e realizada em nações do Norte Global. É importante contextualizar onde nascem as nossas bases sobre um tema tão complexo e plural. Há um abismo contraditório entre a teorização das experiências negativas  advindas da crise climática e quem lança luz sobre isso. Afinal, justiça climática está entrelaçada com as narrativas marginalizadas com suas próprias lentes de mundos, vivências e opressões sociais, raciais e territoriais.

JUSTIÇA CLIMÁTICA COMO BÚSSOLA

Dito isso, muito ouviu-se - antes e durante a COP 27 - que esta seria a cúpula da implementação e da justiça climática. Em parte, devido ao cenário no qual a conferência foi sediada. Por outro lado, devido à presença mais expressiva de movimentos sociais e populações do Sul Global. Na delegação brasileira, por exemplo, observamos uma pluralidade maior do que representa o Brasil: a negritude, quilombolas, indígenas, periféricos, mulheres e juventudes em pauta entre as geografias dos pavilhões da conferência global.

No Brazil Climate Action HUB, justiça climática e mulheres na ação climática foram os temas norteadores da abertura da programação do espaço da sociedade civil brasileira na COP 27. Contudo, sabemos que não há soluções simples para problemas estruturais e complexos de invisibilidade. Assim como o racismo e as desigualdades não cessam com ações pontuais, o acordo revolucionário de perdas e danos também vai percorrer uma jornada de médio a longo prazo para reparar tantas injustiças climáticas que seguem acontecendo em países pobres e em desenvolvimento.

Diante disso, o princípio de "responsabilidades comuns, porém diferenciadas" voltou a aterrissar nas discussões, posicionamentos e planos de ação. cabe ressaltar que um fundo para perdas e danos é um mecanismo transversal à justiça climática. É uma expectativa por reparação de danos e por uma adaptação climática justa, equitativa e inclusiva. Nesse horizonte, diante de tantas turbulências e tensões geopolíticas acontecendo simultâneamente, o resgate a credibilidade internacional do Brasil, as propostas do movimento negro e indígena, a voz da juventude pautando temas intergeracionais ancorados em evidências configuram uma nova e estratégica jornada que, mais uma vez, legitima que a agenda do clima é muito mais do que apenas números estatísticos, ciência e negociações. É uma agenda de justiça climática, racial, de territorialidades, de gênero e de gerações futuras. Que venham, então, os desafios de 2023! Temos pressa e prontidão para novos enfrentamentos.