Investindo na natureza para um futuro resiliente
Por Jennifer Morris, CEO Global da The Nature Conservancy
Este artigo é parte de uma série na qual especialistas e formadores de opinião da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OECD) - de todo o mundo e de todos os setores da sociedade - abordam a crise da COVID-19, discutindo e criando soluções presentemente e para o futuro. Com o objetivo de promover um intercâmbio frutífero de experiências e perspectivas de vários campos para nos ajudar a enfrentar esse desafio crítico, as opiniões expressas não representam necessariamente as da OECD.
Na esteira da COVID-19, os governos nacionais e agências públicas de desenvolvimento estão injetando trilhões de dólares em assistência médica, auxílio imediato ao desemprego e outras medidas de apoio econômico direto. Mas, até agora, os “pacotes de recuperação verde” propostos ficaram aquém. Dos US$ 14,9 trilhões de estímulos anunciados até o momento, apenas US$ 1,8 trilhão (até o momento da análise) era “verde” o suficiente para reduzir as emissões de gases de efeito estufa ou melhorar a natureza e a biodiversidade.
Estamos testemunhando uma das transições econômicas mais rápidas já vistas - mas ainda há tempo para incorporar planos de recuperação positivos para a natureza que apoiem um futuro mais resiliente para as pessoas, o planeta e a prosperidade econômica.
As evidências sugerem que investir em uma recuperação positiva da natureza terá retorno no longo prazo. Além de garantir um planeta habitável para toda a vida na Terra, uma transformação sistêmica para uma economia amiga da natureza poderia criar 395 milhões de empregos e gerar US$ 10,1 trilhões em valor econômico até 2030, de acordo com o Fórum Econômico Mundial. Uma pesquisa encomendada pela The Nature Conservancy estima que a implementação de soluções que melhoram a natureza globalmente—incluindo reflorestamento e melhor gestão florestal—pode contribuir com US$ 25-90 bilhões em valor agregado anualmente até 2030. E isso sem considerar o preço do carbono.
Temos uma enorme oportunidade de repensar como e para onde os recursos devem ser direcionados para fazer mudanças nos nossos sistemas que restaurem o planeta e forneçam serviços que apoiem a vida das pessoas.
Considere os subsídios à agricultura: aproximadamente US$ 500 bilhões em subsídios agrícolas em todo o mundo perpetuam os sistemas insustentáveis de uso da terra e alimentos, que levam à degradação ambiental, má nutrição e desigualdade de renda. Se não fizermos nada com relação à maneira como produzimos e consumimos nossos alimentos, o dano estimado será de US$ 16 trilhões por ano até 2050. No entanto, redirecionando subsídios prejudiciais para práticas sustentáveis, incluindo a agricultura regenerativa, os governos podem acelerar o progresso do clima global e da biodiversidade. Essa mudança pode fornecer 40% do financiamento que precisamos para proteger e restaurar a natureza—sem precisar gerar novos fluxos de financiamento. Precisamos de mais mudanças como essas e precisamos delas urgentemente.
Dois componentes podem garantir uma recuperação verdadeiramente ecológica e positiva para a natureza. O primeiro é uma transição rápida para economias de baixo carbono. O segundo é o financiamento e a escala de soluções baseadas na natureza que podem oferecer benefícios de mitigação e adaptação ao clima, bem como uma ampla gama de serviços de infraestrutura vitais, como melhoria da qualidade da água, controle de inundações e redução do risco de desastres—ao mesmo tempo em que beneficiamos a biodiversidade.
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Soluções baseadas na natureza podem estimular a resiliência em face de choques sistêmicos em nossas economias e ecossistemas. Por exemplo, estudos mostram que conservar e restaurar áreas úmidas, apicuns e manguezais é uma das formas mais econômicas de proteger as áreas costeiras de tempestades e inundações. Depois que o furacão Sandy atingiu o nordeste dos Estados Unidos em 2012, os cientistas da TNC, em parceria com o Lloyds de Londres, descobriram que as áreas úmidas costeiras evitaram mais de US$ 625 milhões em danos potenciais à propriedade, absorvendo a energia das ondas e reduzindo a elevação do mar.
As florestas oferecem outra grande oportunidade. A restauração florestal em larga escala de pelo menos 350 milhões de hectares até 2030 poderia gerar US$ 170 bilhões por ano em benefícios líquidos de proteção de bacias hidrográficas, melhores safras e produtos florestais—enquanto sequestra mais de 5 bilhões de toneladas de emissões de carbono a cada ano.
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O encontro do G7 em junho é uma excelente oportunidade para mudar narrativas e políticas. Os países do G7 podem mostrar liderança global em aumentar seus esforços para recuperação de várias formas:
- Garantindo que todo o investimento em infraestrutura considere alternativas sustentáveis ou híbridas, e apliquem a hierarquia da mitigação (evitar, reduzir e compensar impactos) para todos novos investimentos;
- Se comprometendo a auditar seus subsídios para sistemas alimentares, seguindo as recomendações da OECD, e cobrando a redução ou, pelo menos, o redirecionamento de subsídios mais prejudiciais para apoiar a agricultura regenerativa e ações de de proteção da natureza;
- Concordar em explorar medidas para garantir que todas as commodities importadas para seus países sejam livres de desmatamento;
- Dobrar recursos de ajuda externa para natureza para apoiar os países em desenvolvimento a alavancar os fluxos de recursos privados e domésticos, além de deixar 30% dos recursos de combate às mudanças climáticas para soluções baseadas na natureza.
Se quisermos mitigar a crise climática, reduzir a desigualdade, estabilizar a economia e alimentar uma crescente população global, temos que proteger, restaurar e manejar sustentavelmente a natureza. A devastação da pandemia de COVID-19 mostrou uma oportunidade para encontrarmos um novo caminho, no qual podemos fazer mais pelos nossos sistemas naturais, que são a base para a saúde da sociedade.
Publicado originalmente no fórum da OECD
20 de abril de 2021
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