A Conservação da biodiversidade é uma aposta segura da humanidade
No final de 2021 acontecem eventos que vão definir compromissos importantes para proteção e regeneração da biodiversidade.
Por Rodrigo Spuri - Diretor de Conservação TNC Brasil
Os meses de setembro e outubro de 2021 concentraram encontros importantes para a discussão de ações de proteção à biodiversidade do nosso planeta e combate às mudanças climáticas, que estão colocando em risco o nosso bem-estar e, em última instância, a sobrevivência da nossa sociedade.
Entre 11 e 15 de outubro, a primeira etapa da COP-15, Conferência das Partes da Convenção sobre a Biodiversidade da Organização das Nações Unidas reuniu em formato virtual governos de todo o mundo para iniciar as discussões sobre o conjunto de metas para a natureza para a próxima década, por meio do acordo da Convenção sobre Diversidade Biológica pós-2020. Um dos resultados da conferência foi a assinatura da Declaração de Kunming por mais de 100 países. O acordo retoma os objetivos da Convenção da Biodiversidade (CDB) de proteger 30% do planeta até 2030 (também chamado de “30 por 30”). Além disso, criou-se um fundo internacional para a conservação ambiental, com China anunciando uma doação de 233 milhões de dólares para os países em desenvolvimento, enquanto o Japão prometeu injetar cerca de 16 milhões de dólares. A segunda parte da COP-15 deve acontecer entre abril e maio de 2022, possivelmente em formato presencial, e tudo pode mudar. Alguns países, inclusive, optaram pela definição de pontos mais delicados de negociação nessa ocasião.
Esperamos que agora seja diferente das oportunidades anteriores e consigamos implementar os compromissos firmados, uma vez que a forma como nos relacionamos com a natureza pode ser decisiva para a nossa civilização e para o futuro de toda a vida na Terra. É urgente focar em ações para combater a crise de saúde climática e econômica que estamos enfrentando, e que não irá melhorar se não mudarmos nossas atitudes de forma sistêmica.
Aliás, todas as evidências mostram que o investimento efetivo na proteção e recuperação da natureza positiva terá retorno a longo prazo. Uma pesquisa realizada pela TNC estimou que a implementação de soluções que melhoram a natureza globalmente - incluindo reflorestamento e melhor gestão florestal - poderia contribuir com US $ 25-90 bilhões em valor agregado anual até 2030! As emergências naturais e climáticas devem ser abordadas em conjunto - uma biosfera saudável e funcional em um clima estável é fundamental para o bem-estar e o desenvolvimento humano. É importante ressaltar que a crise climática e a crise da biodiversidade estão estritamente ligadas. Não é só o desmatamento ou a redução de habitats que impactam diretamente a biodiversidade, mas existe um motor de retroalimentação que transforma os sistemas ecológicos e impacta animais, plantas e seres vivos como um todo.
Em setembro, milhares de profissionais, cientistas, especialistas em políticas e conservacionistas estiveram reunidos no Congresso Mundial da Conservação da União Internacional para a Conservação da Natureza (IUCN) e, após quatro dias de discussões e apresentações, foram expostas quatro chamadas para ações prioritárias:
I) Para conter a perda maciça de vida selvagem e natureza, devemos coletivamente parar e reverter a perda de biodiversidade até 2030;
II) Devemos ampliar e acelerar a escala da ação climática com velocidade sem precedentes;
III) Devemos considerar os impactos ambientais da infraestrutura (por exemplo, estradas, ferrovias, energias renováveis) dentro dos pacotes de recuperação de estímulo econômico;
IV) Devemos defender com urgência os direitos humanos ao acesso a alimentação adequada, saúde, água e um meio ambiente saudável.
No final do evento, Linda Krueger, Diretora de Política de Biodiversidade e Infraestrutura da TNC e chefe da delegação da organização no Congresso, deixou um apelo claro para a necessidade de se definirem ações mais concretas para a proteção da biodiversidade, passando da teoria à prática. Ela destacou que, apesar do desequilíbrio da nossa relação com o meio ambiente, da rápida perda de biodiversidade e da escalada da emergência climática, não é tarde demais para se mudar o equilíbrio da balança. É preciso que os formuladores de políticas globais, assim como as empresas, que expressam publicamente o seu compromisso para com o clima e a biodiversidade, passem das palavras aos atos e que sigam em frente com regulamentação, investimento e ação.
Nesse cenário, é importante destacar que o setor privado também pode e deve desempenhar um papel fundamental na proteção da natureza. E, para que isso aconteça, os governos precisam abrir o caminho, implementando um ambiente regulatório certo, incentivos inteligentes e estruturas de mercado para catalisar os fluxos financeiros do setor privado para a conservação da biodiversidade.
A única maneira de impedir a perda de biodiversidade global é garantir que a natureza seja valorizada de forma adequada em todas as economias. Isso exigirá liderança política ousada, mecanismos e incentivos transformadores que desencorajem ações prejudiciais e incentivem o financiamento em grande escala para a natureza.
O Fórum Mundial da Bioeconomia, que aconteceu pela primeira vez fora da Europa, entre os dias 19 e 21 de outubro, em Belém, Pará, na Amazônia, foi outro evento marcante, que teve como seu principal propósito o de encorajar os investimentos em atividades econômicas que garantam a floresta em pé. Foi uma edição muito importante para fortalecer parcerias para a conservação da natureza na Amazônia, uma vez que o evento apresentou Belém, o estado do Pará e suas comunidades tradicionais como verdadeiros polos da bioeconomia.
Durante o evento, inclusive, a TNC lançou o estudo "Bioeconomia da sociobiodiversidade no Estado do Pará", que mostra o potencial que o estado tem para a bioeconomia, destacando a importância dos Povos Indígenas e comunidades tradicionais neste mercado.
Como preparação para o Fórum, a Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Sustentabilidade do Pará, com o apoio da TNC, @GCF Task Force e PNUD Brasil promoveu quatro webinars, de 27 a 30 de setembro. Eles tiveram como objetivo a discussão, com especialistas, sobre o futuro da Bioeconomia na Amazônia, a fim de gerar insumos para o desenvolvimento de políticas públicas estaduais de promoção de uma bioeconomia inclusiva que gere desenvolvimento sustentável a partir de soluções baseadas na natureza e conservação dos recursos naturais. A finalidade é a de reduzir o desmatamento e restaurar as florestas, melhorar os meios de vida das populações indígenas, extrativistas e quilombolas por intermédio da redução da pobreza e da proteção ao clima.
Convido a todos a assistirem a estes interessantes e relevantes momentos de discussão.
Há um enorme caminho a ser percorrido, por governos empresas e sociedade civil, para que a biodiversidade seja conservada e para que a humanidade veja na proteção da natureza, também, uma vantagem econômica.